domingo, 6 de maio de 2012

As cartas que eu não mando


Quinta-feira,  19 de Novembro de 1990

 Querida Lita, é um grande clichê, todavia, estou morrendo de saudades de ti. A vida está difícil aqui no Sertão, chove pouco, e está muito sol, como de costume. O dinheiro que eu ganho é com coco de cabra, eu colho e vendo no Mercado Municipal, pelo menos consigo comprar alimento, já que aqui eu não me preocupo muito com energia elétrica.
 Sabe, aquela vez que você veio foi muito gostoso, observamos o luar com cheiro de coco de vaca, mas, estava bom. Acredita que toda vez que eu sinto o cheiro de coco de vaca, eu lembro de você? é nojento, e pode ser até ofensivo para quem estiver lendo essa carta a não ser você, mas, só você sabe das nossas palhaçadas, e de como tentamos fugir desses padrões que as pessoas impõem sobre respeito. As vezes eu ligo o rádio, e lembro muito de você, poucas vezes tocam uma música que fala da gente, mas, toda vez que eu a escuto, eu lembro de nós, essa música se chama Maurício”, e é do Legião Urbana. Se lembra quando a gente ia para os bailes, e de repente tocava Geração Coca-Cola? Então, a gente pogava que nem louco ao ouvir essa música, e as pessoas morriam de inveja, pois, ninguém agitava como a gente, só nós do baile íamos para sons de punk rock. Lembra também quando tínhamos uns 13 anos, e trocávamos  figurinhas de um álbum do “sistema solar”? tinha uma página que era para completar o sistema solar, e as outras mostravam alguns deuses, algumas coisas de astrologia, e como era o signo em sua forma física. Foi aí, que começamos a ficar horas no quarto, falando sobre as qualidades e defeitos dos nossos signos. É inverno em São Paulo, e o seu signo talvez não combine tanto com esse tempo, mas, espero que você arranje alguém para te aquecer nesse frio que é infernal.
 Lita, você sempre soube que você é o amor da minha vida, mas, o meu signo sempre presou pela liberdade, logo, eu quero que isso seja recíproco e também ético. O meu amor, é o verdadeiro sentido do “amor platônico”, sua tolinha, e toda vez que eu vou para aí, ou você vem pra cá, a gente se diverte e mata as nossas saudades. Estava contando para um amigo que mora em um sítio aqui perto sobre o meu primeiro beijo, ele ficou horrorizado quando eu disse que foi com 12 anos, e eu ainda disse com o maior orgulho: - FOI COM A LITA!
 Estou juntando um dinheiro para ir pra São Paulo no final do ano, querida, quero assistir uma peça de teatro, ir para um som de punk rock, e ver o otário do Carlos. O Carlos é um cara que eu tenho uma forte admiração, os anos passaram e ele continua com o mesmo ideal, continua anarquista, e lendo os livros do Bakunin, mas, ele sempre ficou bravo por eu colocar os rebites de uma forma que ficassem alinhados.
 Lita, fique em paz nesse inverno infernal. Receba este disco que eu encontrei em uma pequena discoteca da cidade. Nele tem a música “Maurício”.

 Um forte abraço de um indivíduo que sempre te considerou e amou, Bill Ramos.

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