quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Futuro


Cada pegada é um afronte 
E toda palavra vai compor
o que eu ainda não sei
pois bom é o que não se sabe

Mas tu aparece
Como anjo sem rosto
Não sei se por baixo deste lençol
tem um corpo ou um cabide
O fantasma deixou de ser passado

Os anos presenteiam o homem
Não são terrenos convencionais
São desertos
Aprenderemos a nos equilibrar em bolhas
Ser humano nasce descalço
Ninguém mata a sede de sapatos
Nossos calos são grutas


terça-feira, 3 de novembro de 2015

Coloco um terno
Que comprei para um momento especial
Olho-me no espelho
Segurando nas mãos um revolver
E é possível ver o reflexo da cama
Amontoada por inúmeros papéis
Cartas que nunca enviei

O que marca um homem
Talvez seja a sua morte
É na notícia do escritor morto
Que, finalmente, é lido
Buscam vasculhar as causas
No esconderijo dos seus versos
Os homens o leem
Para entender a si mesmos
A morte inspira muita gente

Ponho o revolver na boca
Sinto com a língua
O gosto da ferrugem
Meus dedos tremem
"Se morrer fosse fácil
Todo mundo suicidava-se"
É preciso coragem
Para puxar o gatilho 
Contra si mesmo
Ninguém segurou Sócrates
Para que engolisse a cicuta


quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Quero assumir em mim a infelicidade
Abandonar os ornamentos não duráveis
Que nada admitem sobre o que sinto
Instaurar sempre a verdade
Sem repúdio

Eu quero colher no sonho
Um botão de começo
Não uma flor artificial
Fazer em mim um campo de poucos bezerros
Ao dormir com um gado alheio

Ah, como é difícil
Tornar-se o que se é
É assumir uma dor sem prazo
Mas um ato digno
É imprimir-se à história
Presentear o mundo com sua cruz


sábado, 25 de julho de 2015


Este sou eu que retorna
Sem saber quem esteve aqui
Aceitando o quarto que foi pintado
E esperando o telhado ser consertado

A esquina tem alguns postes novos
Mas continua com o mesmo gosto
Acho que esqueci como que se encosta
Porém, estou pronto para mais uma
O demônio agora sou eu

Me dê aquela chapa de ferro
Vamos fazer barulho nestas grades
Antes eu tinha medo de gritar
Agora, quero que gritem ao me verem
Vejam, este é o rosto sujo que cultivastes
É o que se ganha quando arranca a esperança

Ande, devolva-me o que levou
Pois fiquei tanto tempo acordado
Que não me faz mais diferença
Esperá-lo na porta da sua casa
Até que saia

Vamos dar uma volta
Me apresente estes quarteirões
Que percorrestes todos os dias
Quero manipular as tuas escolhas
Pois agora sou a tua tentação
O demônio que lambe a sua orelha



sábado, 16 de maio de 2015

Nunca pensei que houvessem mastigares tão lindos
Mastiga para nutrir
Engole com cuidado
Ensina-me a mastigar
A sentir o gosto como sentes
Quero aprender a mastigar a vida com você

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Testei todos os sofrimentos possíveis
Me apunhalei de todas as maneiras existentes
Inexisti com a finalidade de comprovar a minha existência
Hoje só me encontro restaurado
É difícil caminhar com medo que caia algum caco
Por melhor que seja a cola
A vida sempre depende do desgaste

Reconhecer os motivos da dor

Lancei uma pedra no lago
Fiz com que os peixes fossem embora
É incrível o nosso abismo de espantar
Sem antes sequer termos nos conhecido
Espanto até a mim mesmo
Bato na porta e não me atendo
Há um desespero de mim
Fiz da existência um calabouço
Amordacei os lábios da alma
Restou apenas murmúrios no eco
Naquele quarto escuro e fedido
Eu sou sequestrador de mim mesmo
Me persegui pelas ruas
Asfixiei o que tinha de melhor
Adoeci nos caprichos que não precisava

Quando o desespero vem te visitar

Mãe, por favor não me deixe aqui
Com todo esse desespero que ninguém pode ouvir
A vida e as pessoas não querem ficar
Você por obrigação tem de me amar

Mãe, a vida anda tão difícil
É uma angústia que só o estado de não-inocência
Pode vir a proporcionar as nossas vidas
Estado que dói aos mais felizes

Quem dera poder retroceder a tudo
Principalmente os momentos
Em que eu tenho sido o mais injusto
Voltar a ser uma criança despreocupada
Ficar triste somente por um brinquedo quebrado

Mas mãe, por que as pessoas tem de partir?
E porque elas partem e eu que fico despedaçado?
Tentando me recolher nesses pedaços que estão virando pó?

Por que nós nascemos tão dependentes?
A vida é injusta
E nós mesmos que a cometemos
Será que existir é o mesmo que sofrer?
Todas as coisas são tão passageiras,
O fim me desperta o desgaste
E triste é saber, que todo verão é passageiro
Juro, eu não nasci pra viver no inverno!

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015


Retomo todos os momentos em que achei estar feliz, como também as situações que Deus manifestou-se e não pude ser capaz de percebê-lo. De tão ingrato, pouco agradeci por sua mão em minha vida.
Nenhum valor anterior me faz tão bem como o de finalmente escolher estar em Cristo. Os meus olhos jorram lágrimas quando percebo o seu sopro e acolhida, suas movimentações representam um novo tempo em minha vida. Para deixar de viver segundo a mim, sou capaz de me desprender de todos os valores que tive no passado, pois o eu fez-se insuficiente.
Antes de perceber o Senhor em concretude, me entreguei a uma diversidade de experiências incabíveis ao hoje. Admito que algumas marcas dos ontens, ainda estão impressas na minha psiqué, quero que Deus me dê o dom definitivo de esquecer e perdoar. Esquecer para acolher e perdoar para ser acolhido. Quais são as estruturas que devo derrubar para essa nova construção?

Senhor, na viagem para vê-lo face a face, quais são as vestimentas que devo levar em minha bagagem? Devo retomar à minha infância, na qual a minha vontade pelo seu rosto era irrespondível, ou a dureza da percussão temporal é essencial para chegar até aí?